terça-feira, 2 de junho de 2009

O caminho das borboletas...



Lau Siqueira

No século VI a.C., o legislador grego Sólon, criou muitas leis. Uma delas considerava crime se acovardar diante de uma discussão. Mas, ele não parou por aí. Entre outras coisas, institucionalizou a distinção entre “boas mulheres” e “prostitutas”. Um fato jurídico que simboliza até hoje o patriarcado. Certamente que vem daí também o casamento civil. Pois as “boas mulheres” eram aquelas que procriavam e constituíam família. Certamente, também, a engrenagem que estabelece os diversos níveis (ou seriam desníveis?) sociais da prostituição. Uma força estranha que atravessou os milênios e se espalha pelas calçadas e pelos prostíbulos de João Pessoa e do mundo.

A prostituição era um componente fundamental na vida social da Velha Grécia. Nas cidades mais desenvolvidas - geralmente localizadas nos portos - o ‘setor’ empregava boa parte da população. A profissão era considerada uma atividade comercial de relevância. Dizem que Sólon também institucionalizou em Atenas, os primeiros bordéis. Os preços dos serviços eram regulados pelo Estado. Havia até cobrança dos impostos do que chamavam de “comércio de carne”. As prostitutas, nesse tempo eram classificadas segundo os impostos que pagavam. Havia prostitutas baratas (pornai), as “peripatéticas” e as prostitutas (hetaera*) de nível alto também chamadas de “companhia feminina”.

A antiguidade também guarda um espaço sagrado para a prostituição. A deusa Isthar, nascida na Suméria, foi revelada pelo historiador grego, Herótodo, quando este escreveu a respeito da Babilônia. Ela era o símbolo da hospitalidade com um preço simbólico. Ishtar tinha alguns rituais de carater sexual, uma vez que era a deusa da fertilidade. Alguns dos rituais tinham a ver com libações e outras ofertas corporais. Já a deusa Vesta, do Império Romano, exigia a virgindade total ou a entrega total. E todo o culto às deusas era feito através de rituais. Até mesmo na Bíblia o nome de Madalena coloca os fiéis de Jesus Cristo frente a uma grande contradição. Desta época, destacamos Herodes que também era chegado a um cabaré.

Algumas prostitutas de luxo acabaram virando mito. Como Messalina, por exemplo. Ela casou com o imperador romano, Cláudio, aos 16 anos (Ele tinha 49). Na Roma Antiga a depravação não era privilégio dos homens da corte. Algumas mulheres eram ainda mais chegadas ao excesso sexual. Messalina imitava as prostitutas profissionais da noite romana. Ela copiou as prostitutas, até mesmo ao receber no palácio todos os homens que a desejassem. Chegou a competir com outra prostituta profissional, apostando e vencendo uma maratona de sexo com 25 homens em uma única noite. Quando não se dava por satisfeita, saía pelas ruas à procura de amantes, mandando matar os que a recusassem.

Na literatura, são vários os exemplos. Mas, podemos citar Adriene Legay, personagem central no conhecidíssimo conto de Maupassant, Bola de Sebo. Conto, aliás, que foi adaptado de forma genial por Chico Buarque de Holanda. Bola de Sebo passou a chamar-se Geni, personagem da Ópera do Malandro, em música de sucesso nos anos 80. Nesse conto, Guy de Maupassant não poupa críticas ao cinismo e a hipocrisia da sociedade francesa do século XIX. Chico repete a dose em relação á sociedade brasileira dos anos 70.

Nesses dias iniciais do século XXI não mudou muita coisa. Em alguns casos, nem mesmo a relação com o Estado e com a sociedade. Os preços variam. Ora vale um emprego, ou uma ascensão profissional. Ora vale um casamento por interesse, com as benesses e títulos de madame. Ora vale nota em alguns cursos ditos superiores. As profissionais que cercam os hotéis gostam de ser chamadas de “acompanhantes executivas”. Mas, também são chamadas de rameiras, quengas, putas, pitombas... seja qual for o nome. Na realidade todas elas são apenas prostitutas. As meninas da Associação das Profissionais do Sexo – APROS, não gostam da nomenclatura “politicamente correta” de profissionais do sexo. Preferem mesmo ser chamadas de prostitutas. Mas, apenas são mulheres que lutam com determinação por seus direitos constitucionais ao exercício da cidadania plena.

As pessoas ditas “de família”, não raras vezes, se sentem incomodadas com a proximidade de pontos de prostituição e bordéis. Algumas das meninas afirmam que alguns desses “incomodados” são usuários dos seus serviços. Não podemos esquecer que o imposto que a classe média paga para morar em casas confortáveis, não chega aos pés do imposto social que a grande maioria das prostitutas sempre pagou pelo direito à sobrevivência. Outro dia, em trabalho de campo na praia de Cabo Branco, juntamente com a APROS e a Coordenadoria de Políticas Públicas para a Mulher, conversando com uma jovem prostituta, soube que tinha um filhinho de seis meses em casa, sendo guardado pelo marido desempregado. Percebe-se, então, o quanto muitas vezes somos cruéis quando viramos o rosto para a realidade que nos cerca. Impossível, pois, não termos este assunto no centro do debate no momento em que se comemora o Dia da Prostituta.

O que precisa ficar claro é que as prostitutas, em busca de reconhecimento profissional, deverão necessariamente manter uma postura profissional. Inclusive sem beber ou se drogar no trabalho. Sobretudo, buscando uma convivência harmoniosa com a comunidade onde vive ou onde trabalha. E por uma questão de sobrevivência, até mesmo com as engrenagens de consumo da sociedade capitalista que, sabemos, ao mesmo tempo em que condena, hipocritamente sustenta a prostituição nos mais diversos níveis.

*hetaera quer dizer prostituta, em grego. Mas, também é o nome de uma borboleta brasileira, hetaera-esmeralda. Foi descoberta na Amazônia em meados do século passado por um inglês.

5 comentários:

Erica Maria disse...

sou tua fã.

Erica Maria disse...

eu, essa menina aqui.
sou tua fã.

Erica Maria disse...

eu pensei que não tinha sido postado o comentário, aí vi que tu precisa aprovar..aí tu apaga o outro, tá? bjo!

Flávia Muniz Cirilo disse...

Que interessante! A borboleta e a prostituta... Dessa eu não sabia... Bom tema. bjos

Lau Siqueira disse...

Apaga nada... viva Ericamania!

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