Por Lau Siqueira
A mídia globalizou-se. Chegou
às comunas do mundo. Todavia, a intensidade da difusão continua privada. O eco
maior é propriedade de poucos. Mesmo assim as periferias do mundo resistem. Se
a mídia banalizou a cultura do povo, as ruas a consagraram. Existe uma pulsação
imensa por fora das grandes cadeias midiáticas. Afinal, é cada vez mais fácil
gravar um disco em qualquer lugar do país. Nem sempre com as melhores
estruturas. Pouco importa, pois um ouvinte atento é capaz identificar os
melhores conteúdos. “Da minha cabeça cuido eu”, já dizia um sábio
andarilho dos anos 70. Difícil mesmo é fazer com que o trabalho feito “na tóra”, como se diz, tenha repercussão
até mesmo regional. As emissoras de rádio e TV, apesar de serem concessões
públicas, funcionam na lógica do lucro fácil e da audiência conquistada a
qualquer preço. Os que não podem pagar o jabá, os que estão fora das grandes
máfias fonográficas.
Há resistência em qualquer periferia do mundo. Lugares
onde a expressão artística é a forma do conhecimento adquirido através das batidas,
dos traços e da ginga do Hip-Hop. Assim é o disco do CGzoo, “Bem Vindos à
Selva”. Uma pancada de rimas e de som bancados na batalha. Uma agulha no
removedor de impactos das muitas nações-coxinha da Paraíba. O discurso é o
traçado do REP (aprendi), ritmo e poesia. A vida árida no efeito dominó de uma estratificação social
traduzida em versos. Mais que uma possibilidade é uma linguagem dialogando com o mundo. Máquina
acelerada, cabelos e bocas celebrando a vida. Assim é a selva onde nada mais
surpreende ou pode surpreender, além da arte e suas possibilidades enquanto
conhecimento e encantamento. O CGZoo sabe das mazelas e inventa suas próprias
curas com sua cara negra-ameríndia pintada para a guerra nossa de cada dia.
O CGzoo traz
a ideologia das ruas brasileiras. As disposições mambembes do som que circula e
se bifurca nas quebradas e na cena alternativa. Os motivos profundos ou banais
da existência. As lutas silenciosas do povo contra a opressão cínica das
elites. Assim vai ganhando o passo a passo da caminhada. Sem espelhos que não sejam
os mesmos espelhos de cada esquina. Onde somos todos da mesma raça humana, com
seus defeitos e suas taras por perfeição. No Quarenta, no Zepa, nas Malvinas, nas
histerias da fome e na saciedade da alma. Não podemos deixar de reconhecer que
diante de imensas dificuldades, de castrações, de soluções impróprias, há uma
capacidade abismal de conduzir o sim e o não. O movimento Hip-Hop, em Campina
Grande, em João Pessoa, em Natal, Porto Alegre ou Cajazeiras, sabe por onde o
sapato aperta. Talvez por isso esse jeito descalço de caminhar.
Esse texto será publicado no Jornal A União, edição de amanhã, sexta-feira, 26/09/14.
Esse texto será publicado no Jornal A União, edição de amanhã, sexta-feira, 26/09/14.
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