quarta-feira, 16 de maio de 2012

Não se protege criança com mentira.


por Lau Siqueira

A situação da infância e adolescência na Paraíba e no mundo é algo que exige bem mais que discurso afiado. No mínimo, exige decência e coerência. Recentemente, incrédulo, ouvi de uma representação dos movimentos sociais que a criança que vive em situação de rua não deve ter a mesma porta de entrada para abrigamento institucional que uma criança que sofre violação de direitos. Como assim? Diagnóstico não é segregação. A criança que vive “dormindo onde as pessoas cospem”, conforme ouvi certa vez de um educador social, já teve todos os direitos violados. Desistir dos casos mais complexos é covardia. Blefe para aparecer bem na fita é crime. Mais que formação técnica e discurso voraz é preciso visão de mundo, humanidade e capacidade de articulação coletiva. Dizem os acomodados que “o problema é do Município”. Certo, mas os problemas do Município são ou não da sociedade? O começo do debate deveria estar na proteção básica, no atendimento à vulnerabilidade da família. Mas, manter a miséria é moeda eleitoral para algumas castas de mau agouro.



Para alguns, o objetivo não é a proteção de crianças e adolescentes. Mas, a disputa dos cargos. Por mais insignificantes que sejam. Pensar políticas para a infância e a adolescência requer postura firme e autocrítica. O compromisso não é com os governantes de plantão, mas com a transformação de uma realidade que transborda pelas esquinas. Infelizmente, a experiência em João Pessoa me faz concluir que esse compromisso - que existe de fato em muitos companheiros e companheiras - é uma farsa para uma corja falaciosa, cujos argumentos não sustentam uma gota sequer de consistência.



Há mais de duzentos anos Rousseau afirmou que uma criança não é um adulto em miniatura. Compreendo que Rousseau quis dizer que as especificidades de uma vida em formação, sem as proteções necessárias, fragilizam a construção dos dias e noites do futuro cidadão ou cidadã. O fato é que o abandono da infância banalizou-se em plena era digital. O mau cheiro dos abutres que se vestem de agentes de proteção e são os violadores é cada vez mais forte. Alguns, resguardados pela impunidade e pelo compadrio institucional. Se tivermos que eleger um inimigo nas próximas eleições que seja a miséria – a maior violação de qualquer direito humano. Se quisermos avançar no que tange à efetivação de direitos para crianças e adolescentes, vamos dialogar até com aquele ser invisível que sobe o vidro fumê nos semáforos diante de uma criança que estira a mão em busca de duas coisas: um não e uma mão acolhedora. A esmola é uma cultura perversa que se reflete na história orçamentária das cidades. E a mentira pactuada é, certamente, a maior violência.

 
Este artigo estará publicado no Jornal da Paraíba do próximo domingo, dia 20 de maio de 2012.

Um comentário:

Unknown disse...

Nossa artigo maravilhoso, a cada dia vc mim supreende amis poeta com esta sua sensibilidade ao falar das politias sociais. parabéns!

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