No livro Comunicação Poética, o ícone concretista
Décio Pignatari afirma que poesia é um tipo de arte plástica. Conceito que ratifica
a boa poesia enquanto obra de arte. Em “Retratos Falados”, publicação do selo
Dobra Literatura (55 pág.), Astier
Basílio reafirma essa ideia. Dramaturgo reconhecido e poeta das melhores águas,
Astier tem uma trajetória muito singular. Cavou seus primeiros versos nas
tradicionais cantorias de viola. Uma herança da alma nordestina do pai.
Transita com maestria pelas formas fixas - sonetista dos melhores – com sacadas minimalistas e experimentações
que buscam banir os excessos para reinventar as sobras, numa poesia reconhecida
pelo público e pela crítica.
Com prefácio luxuoso de Bráulio Tavares e orelha de
Reynaldo Damásio, o livro é uma exposição do invisível. Em pinceladas sutis, ou
mesmo num tsunami de cores e imagens, Astier retrata ícones da cultura local e universal.
Também traduz obras imprescindíveis para a história da arte. Por exemplo, a
polêmica escultura “O Porteiro do Inferno”, do paraibano Jackson Ribeiro -
obra de referência na arte de vanguarda brasileira. O poeta e crítico de Aroeiras-PB, Hildeberto
Barbosa Filho é um dos “modelos” pintados por Astier com a tinta rara das
palavras. Também George Harrison, B.B. King, Bom Dylan, Juan Rulfo, João
Gilberto, Haroldo de Campos, Ivanildo Vila Nova (“Os lábios em rascunho, o
estar stereo./ A única performance, a do verso”)... Personagens espalhados pelo
mundo são retratados em versos densos, em soluções de afeto ou ira, numa
apologia ao eterno espanto diante da arte e suas possibilidades.
Versos arrancados de mergulhos em águas profundas,
como “a paixão corre o risco de um palco”, em Soneto de amor de Tonho e Paco. Um
retrato falado que despe um clássico de Plínio Marcos. Enfim, temos aqui uma
obra que reafirma o poeta, o dramaturgo, o ficcionista e cantador Astier Basílio, entre os que desafiam o
limite, os que ousam além do suportável em nome da poesia. Assim nasceu esse
pintor do imperceptível, coletor de sonhos de luz e sombras, como diria Bachelard.
Com Retratos Falados Astier Basílio prossegue sua esgrima
com uma poesia que não o abandona, mesmo nos textos jornalísticos. Especialmente
no que Flaubert define enquanto arte literária e na contramão dos escambos
cotidianos, dos caldos de batatas da cultura de massas. Estamos diante de mais
um espetáculo da resistência e da proeminência de um escritor que, em cada
movimento, afirma seu nome na História das Literaturas, fechando o cerco com o
pensamento aguçado de Pignatari: “a poesia é uma aventura, mas uma aventura
planejada”. Astier conhece todas as trilhas, mas não cansa de inventar
caminhos.
Este texto será publicado amanhã, na minha coluna do Jornal da Paraíba.
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