Rita Lee foi bastante exata quando postou em
seu Twitter, recentemente, que preservar a tradição era manter a chama e não juntar as cinzas. Este, talvez seja o ponto de
partida para um debate que evolui a cada dia, sobre a permanência das
impressões em papel ou a sua gradual migração para os meios virtuais. Na
verdade, apesar de já podermos observar algumas tendências, ainda é cedo para
conclusões definitivas. Alguns fatos revelam uma tendência, mas ainda sem a
repercussão esperada. Um dos mais conceituados e tradicionais veículos de
comunicação como o Jornal do Brasil ter migrado totalmente para a internet não
passa impune ao observador mais desatento. No entanto, ainda nos perguntamos se
é uma tendência ou apenas uma opção de mercado. Afinal, estamos longe de
afirmar o fim do livro em papel, mas o comércio de e-books já é uma realidade
incontestável se é que qualquer realidade não possa ser contestada.
Quando me refiro a necessidade de cautela nas afirmações
acerca do processo migratório do papel para o virtual, seja para a literatura
ou para o jornalismo, me baseio, entre outros exemplos, em uma reportagem
publicada num dos jornais mais tradicionais e conhecidos do mundo, o New York
Times, quando do surgimento da televisão. Na época o jornalista subestimou
demasiadamente o novo invento, ressaltando suas qualidades, mas afirmando que
se tratava de uma invenção sem qualquer valor comercial. O que a história nos
mostra é exatamente o contrário. A televisão passou a determinar o
desenvolvimento de amplos setores da economia. A televisão desenvolveu de forma
significativa setores como a publicidade enquanto vetor de desenvolvimento
econômico, político e social. A comunicação sofreu mais uma revolução. Talvez
semelhante à revolução provocada pela invenção da tipografia. Da mesma forma,
os neo-visionários preconizaram o fim do cinema e do rádio. Entretanto, foi
exatamente após o surgimento da televisão que o cinema e o rádio tiveram suas
evoluções mais agudas enquanto instrumentos de mídia.
Por tudo isso e por mais alguns parágrafos de
argumentos que não irei expor neste momento, entendo que não haverá
substituição alguma. Mais uma vez assistiremos uma evolução dos processos hoje
desenvolvidos. Estamos vivendo a era das velocidades. O que hoje aparece como
novidade tecnológica de última geração, na próxima semana tende a ser
envelhecer devido às novas invenções ou mesmo adaptações. Mas, as tendências desde
que o mundo é mundo nos dizem que com este tipo de evolução as portas estão abertas
para o desenvolvimento humano. A partir da leitura enquanto direito social,
podemos observar com muita tranquilidade que as novas tecnologias acabaram
provocando um equilíbrio maior nas relações sociais, apesar de fornecer também
grandes riscos. O equilíbrio se refere, podemos assim dizer, às ações
contundentes de grupos políticos como os Chiapas. Sem que seja disparado um
único tiro de fuzil, pelas redes sociais, eles colocam o governo do México
contra a parede. Os riscos se referem a oportunidades que intelectuais do crime
como Marcola (que cita Dante no original) passam a ter em relação ao acesso ás
tecnologias de comunicação, a partir da corrupção nos presídios.
Desta forma, entendemos que o fator humano
ainda é insuperável. O que se diz quanto às relações entre a arte e as novas
mídias, faz parte de uma compreensão mais humana das novas tecnologias. Encontraremos
na arte, provavelmente, os melhores indicadores desta tendência. O artista
sempre se utilizou das linguagens existentes para expressar suas angústias
sobre o mundo. Se os renascentistas, na verdade, se utilizaram da evolução tecnológica
em sua época para afinar suas linguagens e expressar sua identidade estética,
também é verdade o contrário. Em pleno século XXI o artista plástico e designer
paraibano Francc Neto, se apropria dos elementos mais rudimentares, mais
primitivos, como o fogo, a cera de abelha, o tempo e suas ferrugens, para
expressar uma arte que, despreocupada com os conceitos de vanguarda, avança
sobre o tempo como um grito futurista. Portanto, o que vemos nesta conjugação
de elementos é outro tipo de preocupação. Talvez algo próximo ao que Proust
escreveu sobre a sedução e os perigos da leitura enquanto instrumento de
evolução da vida. Ou o que Augusto dos Anjos alerta quando diz que “a mão que
afaga é a mesma que apedreja”.
Em última análise e sem qualquer pretensão afirmativa,
entendemos que não haverá, pelo menos num futuro próximo, uma substituição
radical do que se mostra como físico, pelo virtual. Vou ousar aqui afirmar que
o interesse comercial é que determinará a velocidade desta migração. Afinal, o
mercado editorial é um dos raros setores da economia onde o neoliberalismo
avançou de forma escandalosamente silenciosa. Editar livros, no Brasil, se
tornou um negócio altamente lucrativo se observarmos como observamos em um
artigo anterior que o Ministério da Educação é o terceiro maior comprador de
livros do mundo. Cada vez mais o capital especulativo comanda a impresão das
melhores e das piores páginas. A concentração de lucros é assustadora. Por
outro lado, não devemos desligar o sinal de alerta sobre fatos já
incontestáveis como a migração de um dos maiores jornais brasileiros para a
WEB. Ou mesmo para um nicho altamente lucrativo do mercado editorial que se
abre com a comercialização de e-books que chegam aos lares brasileiros com
preços (em dólares americanos) semelhantes aos onerosos produtos impressos
encontrados nas estantes das melhores livrarias. Mas, nem tudo está perdido. Se
quisermos apontar o lado democrático desta migração vamos desaguar na acessibilidade.
Livros e jornais virtuais, por exemplo, colocaram na rota da informação setores
da sociedade silenciosamente excluídos pela história durante milênios, como os
cegos. Programas de computador, atualmente, permitem ao cidadão portador de
cegueira o acesso à obras literárias ou mesmo científicas. Também aos jornais e
portais de notícias, através de programas específicos de tradução oral. Portanto,
antes da condenação ou adesão afobada, as novas tecnologias nos proporcionam o
direito de pensar o mundo em que vivemos de forma mais democrática, mais
universal do ponto de vista social e intelectual e menos globalizada do ponto
de vista econômico e político.
Artigo inédito para a minha coluna do portal RepórterPB (www.reporterpb.com.br)
Um comentário:
Theodor Adorno tem uma obra muito interessante que discute o tema da cultura de massa e tem um posicionamento muito parecido com o seu... mas passei para deixar desejos de um 2013 cheio de paz, prosperidade e alegrias para nossos seguidores...e mais poesia para alegrar a vida!
Abraço do Pedra do Sertão
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