quarta-feira, 10 de junho de 2015

COMO DIZIA GREGÓRIO DE MATOS...

Por Lau Siqueira
Esta semana ouvi o locutor de uma rádio, espantado, anunciar o cachê do Padre Fábio de Melo no Maior São João do Mundo. Também fiquei surpreso: 180 mil reais. No meu tempo Padre só recebia o dízimo. Mas, o valor do cachê não me espantou tanto. Isso é fruto de uma relação fria de mercado, onde a fé “costuma faiá”. O preço é este porque tem quem pague. Me espantou muito mais o miolo da conversa. O assunto era o “redimensionamento” da programação oficial, já anunciada, de onde excluíram artistas como Lucy Alves e Zé Ramalho. Paraibanos da gema e plenamente identificados com a tradição junina. Ora, o cachê do Padre pagava Zé e Lucy com sobras. Se era para economizar, o que justificou a escolha? O fato é que a programação do Maior São João do Mundo vem pisando na bola faz tempo. Atrações que não possuem qualquer identidade com a tradição junina estão “anabolizando” o evento. Mas, isso não é tudo.
Estamos mesmo vivendo tempos bem estranhos para a arte e para a cultura no Brasil. Temos avanços consideráveis, mas as derrotas são abismais. Até o Ministério Público, com sua espada brilhante, pouco dialoga e muito degola. Mas, na margem da política de grandes eventos que domina o nosso país acontecem coisas inaceitáveis. Há uma crescente criminalização e uma cruzada para o extermínio da arte e da genuína cultura brasileira. Seja tradicional ou contemporânea. Uma tragédia anunciada que avança a cada dia sobre os nossos silêncios. Outro exemplo? Há uns quatro anos, a poeta Telma Scherer foi parar numa delegacia por estar fazendo uma performance literária na tradicional Feira do Livro de Porto Alegre. A alegação dos denunciantes é que a mesma estava “atrapalhando o fluxo”. Mais uma vez, portanto, o delírio financeiro apunhalando a arte.
Em Pernambuco, este ano, chegou-se às raias do absurdo. Um deputado apresentou um projeto de lei limitando e até excluindo a ação dos artistas de rua – esses guerreiros que espalham alegria em cenários muitas vezes tão macambúzios. O mais grave é que a Assembleia Legislativa de Pernambuco aprovou esta ameba legislativa e o governador sancionou. Ou seja: estamos vivendo tempos cada vez mais difíceis para artistas e brincantes. Aqui e ali estão excluindo e marginalizando a arte e a cultura. Aniquilando nossa identidade. Tudo em nome das multidões formadas pela milionária indústria do entretenimento. Se temos alguma coisa a ver com isso? Claro que sim. Afinal, estamos debaixo da mesma lona. Ou organizamos nossa alegria, ou seremos arrastados pela tristeza desta silenciosa inquisição. O poeta Gregório de Mattos, sempre atual, já dizia: “Neste mundo é mais rico, o que mais rapa: (...) Quem dinheiro tiver, pode ser papa.”

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